EDITORIAL

Onde termina o Estado e começamos nós?

Editorial

O Estado comparticipa os utentes das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS). Mas, como noticiamos nesta edição do Eco de Vagos, a União das Misericórdias Portuguesas (UMP) diz que a comparticipação mais baixa é referente à terceira idade, sendo manifestamente insuficiente. Quem é que é sobrecarregado com essa carência de apoios? Ao que tudo indica, as famílias.
Nos últimos anos, as instituições viram os seus gastos aumentados, devido à subida do custo de vida e do salário mínimo pago aos funcionários. Se a comparticipação do Estado não cobre esses esses aumentos – ou seja, não é aumentada na mesma percentagem –, as IPSS vêm-se obrigadas a cobrar mais às famílias dos utentes. É aí que entra a questão: onde termina o Estado e onde começamos nós? Quanto é que o Estado deve subsidiar e quanto da estadia num lar deve ficar ao encargo dos idosos e das suas famílias?
O debate é pertinente. As negociações entre a UMP e o Governo estão em curso, por estes dias, para se decidirem os acordos de cooperação relativos às várias áreas de intervenção das IPSS – que começam na primeira infância. E ainda não se sabe se vão chegar a bom porto. Mas, efetivamente, sabe-se que muitas famílias já começam a ter sobre si um peso demasiado difícil de carregar, para que os seus idosos estejam institucionalizados – e, consequentemente, para que tenham qualidade de vida no que dela lhes restar.
É justo que o final de uma vida seja penoso dessa forma, mais ainda do que aquilo que a finitude implícita já acarreta? Falamos de uma faixa etária em que os gastos com a saúde são, quase sempre, gigantes. Em que se gasta em farmácia, em fraldas, resguardos e materiais de apoio quase tanto, ou mais, do que em alimentação. Falamos de pais, de avós, de seres humanos. Que devem ter um fim de vida digno. Todos nós merecemos um fim de vida digno. E já basta a luta por encontrar uma vaga num lar. Ninguém merece, depois, apertar o cinto em demasia, quase a sufocar, a asfixiar, para o conseguir pagar. É aí que o Estado (o Estado social de que tanto se fala) deve entrar. Se não entrar aí, na fase de maior vulnerabilidade da vida de um cidadão, entra quando?

Salomé Filipe
Diretora do Jornal

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