DESPORTO

Os Jogos Olímpicos de Paris e José Manuel Constantino

Desporto
Entre 25 de julho e 10 de agosto decorreu em Paris a 33.ª edição dos JO da era moderna, a maior manifestação desportiva da atualidade, com a representação dos Comités Olímpicos de 192 países, entre os quais Portugal.
A participação portuguesa
Portugal participou com uma comitiva composta por 73 atletas, em 15 modalidades, obtendo 4 medalhas (1+2+1), 14 diplomas olímpicos (até ao 8.º lugar) e colocando 33 atletas nos 16 primeiros lugares nas várias provas em que participaram.
Tratou-se da melhor participação de sempre em JO, resultante de um investimento público de 22 milhões de euros, através de um contrato programa com o Comité Olímpico de Portugal (COP), posteriormente alargado às Federações das modalidades.
São resultados ligeiramente superiores aos obtidos em 2021, nos JO de Tóquio, que traduzem alguma estabilidade (50.º lugar em Paris e 57.º lugar em Tóquio), mas também algum subdesenvolvimento desportivo pois, no contexto da União Europeia, Portugal ficou em 19.º lugar, um posicionamento bastante modesto. Comparando com a Holanda (um país com 17 milhões de habitantes e metade da área de Portugal), a diferença é abissal: 34 medalhas, das quais 15 de ouro. Há, portanto, um longo caminho a percorrer para Portugal ser uma média potência desportiva.

José Manuel Constantino, Presidente do COP
No dia 10 de agosto, ao final da tarde quase em simultâneo com o encerramento dos JO, falecia, em Lisboa, José Manuel Constantino. Embora esperada, devido a doença oncológica antiga, a sua morte causou enorme consternação nos meios desportivos, académicos e políticos e, sobretudo, entre os seus amigos, entre os quais me incluo.
Travei conhecimento com JMC em 1993 quando, sem o conhecer pessoalmente, o convidei para orientar a minha dissertação de mestrado, no âmbito das políticas públicas de desenvolvimento desportivo. Foram 2 anos de contactos pessoais e mensais (recordo que não havia, ainda, a internet), criando-se facilmente uma relação de empatia, de amizade e de consideração mútua. Ficámos amigos e mantivemos essa amizade, embora à distância e de forma irregular, durante mais de 30 anos.
Foi em Vagos que o encontrei uma das últimas vezes: estava a almoçar com alguns presidentes de Câmara da região no restaurante Barracão; interrompi-o durante 2 minutos apenas para o cumprimentar e dar um abraço (a caldeirada de enguias não podia arrefecer) e falámos ao telefone, talvez durante meia hora, no seu regresso a Lisboa.
Honro-me de ser seu discípulo: conheço muito bem o seu pensamento e a sua obra teórica (cerca de 30 livros, como autor, ou coautor e inúmeros artigos científicos e de análise), de que destaco o livro ”Desporto Português: do estado do problema, ao problema do Estado”, um notável estudo prospetivo e estratégico para o Desporto Nacional que, infelizmente, nunca foi seguido pelos decisores políticos.
Prefaciou um livro meu, indicou-me e cedeu-me bibliografia de muito difícil acesso em Portugal, participámos em vários Congressos, trocámos correio eletrónico, falámos ao telemóvel com alguma frequência e recebeu-me, em Lisboa, quando lhe pedia.
Sendo um importante teórico, um cientista do desporto, era, também, um interventor, homem de ação, que acompanhei enquanto Presidente do Instituto do Desporto, Presidente da Confederação do Desporto de Portugal, Presidente da Administração da Oeiras Viva e Presidente do Comité Olímpico de Portugal (no qual estava a terminar o 3.º e último mandato, eleito praticamente por unanimidade). Em todos estes cargos deixou uma marca de gestão irrepreensível.
Foi, durante mais de 15 anos, professor do ensino básico e secundário e, durante outros tantos, professor universitário convidado (na Universidade de Lisboa, na Universidade do Porto, que lhe atribuíram o título de Doutor Honoris Causa) e na Universidade Lusófona, bem como em alguns Institutos Politécnicos, onde orientou dissertações e regeu disciplinas ligadas às políticas de desenvolvimento desportivo.
Tinha uma personalidade marcada por valores: retidão, sentido de justiça, inquietação, manifestada nas suas reflexões, nas suas opiniões e nas suas críticas. Era, sem dúvida, um homem de causas, dedicado ao serviço público, que lutou sempre por um Portugal mais justo, mais rico, mais bem preparado, onde o Desporto ocuparia sempre um lugar central.
Deixou uma obra notável: quer no domínio da teoria do desenvolvimento do desporto, quer como professor e no exercício de diversos cargos, quer no domínio da intervenção cívica.
Partiu para a eternidade, mas ficará sempre como um exemplo de cidadania, de inteligência e de resiliência, ao serviço do Desporto e do seu País.
Até sempre, meu Amigo.
Paulo Branco

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