Opinião
A minha idade já avançada, dá-me um horizonte histórico que me permite descrever as circunstâncias e as consequências referentes à importante data do 25 de Abril de 1974, que possibilitou a instauração da Democracia em Portugal. Permitam-me, por isso, que este escrito assuma a forma de testemunho na “1ª pessoa”.
Em plena guerra colonial, em 1965 entrei para o Serviço Militar Obrigatório e ao fim de 2 anos fui mobilizado para Timor, onde estive mais 2 anos. Como tinha já família constituída, mulher e filha, quis que elas fossem ter comigo, o que aconteceu. No entanto, foi necessário assinar uma declaração a autorizar a saída de Portugal da Maria Eugénia, tal como impunha o regime de Salazar, apesar de ela já ser professora. Era um regime fechado em que a mulher tinha que se submeter à vontade do marido.
Permanecemos 2 anos em Timor e regressámos a Portugal em julho de 1969. Fizemos a viagem de barco e, como o Canal de Suez ainda se encontrava fechado, a nossa viagem demorou 45 dias, porque tivemos que contornar a África pelo Cabo da Boa Esperança. Só parámos em Moçambique e Angola. Foi o mesmo barco que me levou para Timor 2 anos antes, mas a viagem demorou 28 dias porque foi feita pelo Canal de Suez.
Já em Lisboa, mas ainda a bordo, assistimos pela televisão à chegada à Lua dos 3 astronautas, Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin Aldrin. Foi no dia 20 de julho que o Homem pisou pela 1ª vez a superfície lunar, o que constituiu um marco importante para a Humanidade, no dizer de Armstrong.
O tempo em que estivemos em Timor foi fértil em acontecimentos: em 1968 Marcelo Caetano substituiu Salazar na Presidência do Governo, introduzindo algumas alterações que tornaram o ambiente social mais desanuviado: Acabou com a PIDE mas substituiu-a pela DGS; vinha semanalmente à televisão fazer a chamada “conversa em família” e surgiu também um programa de televisão semanal, com Raul Solnado, nosso icónico humorista como figura central. Era o programa Zip Zip, que dava a impressão de que a liberdade estava a passar por aqui. Foi a chamada “Primavera Marcelista”.
Como saímos de Portugal na altura em que Salazar governava o País com mão de ferro e regressámos no período da “Primavera Marcelista”, foi um deslumbramento. Parecia um Portugal Novo. Mas foi sol de pouca dura. Politicamente tudo continuou como dantes.
Em março de 1974 houve um levantamento militar nas Caldas da Rainha, a chamada Revolta das Caldas, que resultou frustrada e que se saldou por uma grande quantidade de prisões. Foi uma espécie de teste para o que viria a acontecer 1 mês depois, a chamada Revolução do 25 Abril de 1974.
A Revolução do 25 de Abril, também chamada Revolução dos Cravos, pôs um ponto final à sociedade fechada em que Salazar e Caetano governaram Portugal durante 48 anos inaugurando a Democracia em que todos os cidadãos são livres e iguais em direitos e deveres. Mulheres e Homens a partir dos 18 anos passaram a poder votar e ser votados. Os Partidos Políticos que são entidades essenciais num Regime Democrático escancararam as suas portas e passaram a ter no seu seio uma forte atividade assumindo um esforço de formação política. Foi um período verdadeiramente singular.
Entretanto, em 1 de janeiro de 1986, Portugal aderiu à União Europeia consolidando-se definitivamente a Democracia.
O Regime Democrático faz 50 anos. No entanto, temos que considerar que a Democracia é como uma planta que é preciso cuidar e regar todos os dias, sob pena de ela começar a definhar, acabando por morrer.
É preciso que os partidos políticos abram de novo as suas portas num esforço de rejuvenescimento, estimulando o exercício da cidadania.
Só assim deixarão de ser clubes de defesa de interesses pessoais em que se estão a transformar.
Temos que voltar a considerar a atividade política como uma atividade nobre que exige de todos os agentes preocupações e exemplos de honradez e espírito de missão. Se assim for nunca deixaremos de ter o privilégio de viver em Democracia.
Viva o 25 de Abril!!!
João Pedro Mateus