EDITORIAL
Gostava que se imaginasse um país sem notícias. Um país onde a rádio só passasse música, as televisões só dessem telenovelas e não houvesse um jornal em papel para comprar no quiosque ou na papelaria. Ao mesmo tempo, também não haveria sites noticiosos na internet. Que país seria esse? Gostávamos de viver nele? Num país onde as novidades só nos chegavam pelo “diz que disse”, pelas conversas de café e pelas publicações no Facebook – onde só consta a verdade de cada um? Como se saberia o que aconteceu na região, no país e no Mundo? Como teríamos acesso a uma informação plural, para que cada um de nós pudesse tirar as suas conclusões? A que se permitiriam detentores de cargos públicos – e privados –, se soubessem que não seriam escrutinados e que os seus atos nunca viriam a público?
Não se consegue imaginar, pois não? Até nunca ninguém conheceu o país assim. Mas as notícias, para chegarem ao público de forma isenta, trabalhadas em prol dos factos e verdade, precisam de ser feitas por profissionais. Precisam de ser feitas por jornalistas. E os jornalistas, se não tiverem condições para as fazer, não vão ao fim da rua nem ao fim do Mundo – aproprio-me, aqui, do eterno slogan da rádio TSF.
O dia 14 de março foi um dia histórico para o jornalismo contemporâneo português. Pela primeira vez em mais de 40 anos, o setor uniu-se numa greve geral, numa altura em que o panorama nacional jornalístico atravessa uma das suas piores fases de sempre. Os jornalistas vivem de salários abaixo do que seria expectável, muitos – muitos, mesmo – em situações de precariedade laboral. Os jornais e as rádios, principalmente, lutam diariamente por se manterem à tona. Discute-se se o Estado deve, a determinada altura, passar a financiar os órgãos de comunicação social, sem que isso lhes retire a isenção, pedra basilar da profissão.
Há muito a discutir e muito pelo qual lutar e, a 14 de março, os jornalistas – deixando de lado a velha lengalenga que nos foi ensinada, de que “um jornalista nunca é notícia” – pararam redações, de norte a sul do país, para que também a sociedade civil olhasse para eles não apenas como aqueles a quem se recorre para divulgar os problemas dos outros, mas como um setor imprescindível da sociedade, que, na sua fragilidade, vive dias difíceis. Dias difíceis esses que, no limite, colocam em causa a própria liberdade dos portugueses e do país. O lema do Sindicato dos Jornalistas foi certeiro: “a liberdade não se escreve sem jornalismo”. Ao que se juntou: “jornalistas sem liberdade não são livres”. Já pensaram que, como diria Sérgio Godinho, “isto anda tudo ligado”?
Salomé Filipe
Diretora do Jornal