DESPORTO

A corrupção desportiva em Portugal

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Em 15 de outubro passado o país foi surpreendido (ou talvez não) com a decisão do Ministério Público (MP) de acusar a SAD do Benfica de corrupção ativa, fraude fiscal e oferta indevida de vantagens, abrangendo também a acusação o ex. presidente Luís Filipe Vieira (LFV) e o antigo assessor jurídico Paulo Gonçalves (PG). O caso conta-se em breves palavras. Aproveitando a frágil situação financeira do Vitórias de Setúbal (VS), o Benfica injetou dinheiro na SAD do VS através de contratos simulados, emissão de faturas falsas e cedência/empréstimo de jogadores que, nos jogos entre ambos, beneficiariam o Benfica.
Para estas acusações, o MP pede sanções: multas pesadas e a suspensão do Benfica de todas as provas, durante um período de 6 meses a 3 anos, o que provocaria a sua descida para o Campeonato de Portugal, ou seja, a 3ª Divisão.
A este processo, juntam-se outros (uns em investigação, outros a aguardar julgamento e outros já julgados). Vejamos:
Por viciação de resultados: através do empresário Miguel Pinho, em 2015/16 tentativa de aliciamento de 2 jogadores do Marítimo e, em 2018/19, através do empresário César Boaventura, aliciamento de 3 jogadores do Rio Ave. O primeiro caso continua em investigação, enquanto o segundo terminou com a condenação do empresário a 3A e 4M de prisão, não se provando a ligação ao Benfica, mas sim a proximidade a LFV.
Caso emails: Acusação a PG e à SAD do Benfica de vários crimes, através da troca de emails entre o Benfica e o ex árbitro Adão Mendes, com o objetivo deste último interferir na arbitragem (em benefício do Benfica, claro).
Caso E-Toupeira – Com condenação do ex. assessor PG (2A e 3M de prisão) por corrupção ativa de um funcionário judicial, para aceder aos processos judiciais do Benfica, no portal do Ministério da Justiça.
Operação Lex – que envolve LFV e o ex. Juiz Rui Rangel (a aguardar julgamento), por crimes de corrupção, recebimento indevido de vantagens, branqueamento de capitais, fraude fiscal e tráfico de influências.
Saco Azul do Benfica, através da prestação fictícia de serviços de consultoria informática, para fazer circular dinheiro do clube, num valor de 2,2 milhões de euros, retirando-o da contabilidade oficial e que ficaram sem controlo administrativo e legal, ou seja, disponível “para tudo”.
São, de facto, muitos casos, são excessivos casos que afetam a credibilidade e o bom nome do Benfica e do Futebol português. É verdade que nem todos foram, ainda a julgamento e que as condenações recaíram, apenas, no assessor jurídico PG que, por ser funcionário e não ser dirigente, não vinculava o Benfica. Mas ninguém desconhecia a proximidade entre LFV e PG, assim como todos conhecem a expressão e a figura do “testa de ferro”, para executar o trabalho sujo e proteger os escalões superiores.
Mas não se pense que a corrupção no desporto se resume a um clube e a uma pessoa: infelizmente não, mas é nossa convicção que se encontra numa fase de diminuição, devido a 2 fatores: por um lado, a intervenção fiscalizadora (e dissuasora) do Estado; por outro, pelo novo perfil de dirigente desportivo (compare-se, por exemplo, Pinto da Costa, com André Vilas-Boas, Bruno de Carvalho com Frederico Varandas e LFV com Rui Costa).
Considerações sobre a corrupção
A corrupção no desporto é uma forma particular do fenómeno geral da corrupção, que, lamentavelmente, afeta muitas sociedades. A corrupção no desporto é definida como “atividade ilegal, imoral e antiética, que tem como objetivo alterar resultados desportivos e a verdade desportiva”. Os corruptores ativos são, normalmente, dirigentes desportivos (ou alguém às suas ordens, que atuam como intermediários) e os corruptores passivos são, normalmente, árbitros e atletas (que podem ser corrompidos para “facilitar” e contribuir para a derrota da sua equipa, ou com estímulos -leia-se dinheiro- para vencer adversários.
Outos casos no Futebol nacional e internacional
O Leixões, em 2015/16, na 2ª Liga, desceu de divisão por se ter provado ação corruptora do seu presidente sobre jogadores da Oliveirense, por forma a darem a vitoria ao Leixões e, assim, evitarem a descida de divisão. O Leixões foi condenado e, atualmente, está na 2ª Liga.
No Futebol internacional houve 2 casos com grande impacto na Europa: em 2004/2006, foram retirados à Juventus 2 títulos de Campeão de Itália e o clube punido, ainda, com descida de divisão para a Série B (2ª Liga). Motivo: corrupção de árbitros, através de dirigentes do clube, que foram ainda penalizados com multas severas e, um deles, com pena de prisão efetiva.
Em 1992/93, foi retirado ao Olympique de Marselha o título de Campeão de França e descida de divisão. Motivo: provou-se que o Presidente Bernard Tapie (que cumpriu pena de prisão) e outros colaboradores subornaram jogadores do Valenciennes numa das últimas jornadas do campeonato.
Para além destes, houve outras situações com impacto: em Itália nos anos 80 e em 2011, através de subornos a atletas de vários clubes, para manipularem resultados de jogos de Futebol de várias divisões, para proporcionarem grandes ganhos nas apostas desportivas. Houve, sobretudo, punições a jogadores de vários clubes, mas não descidas de divisão, pelo facto dos clubes serem alheios ao processo.
No Campeonato alemão, em 2004, o então árbitro internacional Robert Hoyser foi condenado a 2ª e 6M de prisão efetiva por viciar resultados e, confrontado com os factos, denunciou outros casos, que culminaram com a retirada de pontos a muitos dos clubes.
O caso do Benfica
Muitos duvidam que se aplique alguma sanção severa ao Benfica, mas está claro que a Lei se aplica a todos e ninguém deverá estar acima da Lei. A Lei nº. 14/2024, que estabelece o regime jurídico da integridade do desporto e do combate aos comportamentos antidesportivos é muito clara nas sanções: penas de prisão- 1 a 8 anos, para corrupção ativa, 1 a 5 anos para corrupção passiva, oferta ou recebimento indevido de vantagens e tráfico de influências, sendo agravados os limites máximos e mínimos em 1/3, se os agentes forem dirigentes, árbitros, empresários de desporto ou pessoas coletivas.
Para além destas, o Art.º 25º estabelece sanções acessórias: para as pessoas coletivas (leia-se Clubes), suspensão da participação em provas até 5 anos, e para pessoas individuais, suspensão de funções até 5 anos.
Vamos aguardar serenamente, mas todos deveremos querer um desporto mais limpo.
Paulo Branco

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