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A beleza de abraçar o que é diferente

Editorial

Recordo-me há muitos anos ter lido, algures num jornal de âmbito nacional, uma reportagem sobre o na altura Vagos Open Air – atualmente nomeado Vagos Metal Fest – , onde se falava sobre a forma harmoniosa como as gentes do concelho abraçavam os metaleiros que rumavam à vila para assistir ao festival. Na minha memória ficou, até hoje, o contraste que o jornalista do artigo em causa evidenciou, colocando lado a lado idosos de um meio rural e jovens vestidos de preto, com cabelos compridos e aficionados das sonoridades brutas e cruas do “heavy metal”. Ainda que tenha achado, à época, um cenário ligeiramente romanceado – porque quando eu olho para o centro da vila de Vagos não o associo, de todo, a um meio rural com agricultores a regressar das lides do campo –, a ideia de confraternização entre duas realidades distintas ficou-me. E, ainda que eventualmente algo romanceada, em prol de uma leitura prazerosa, enterneceu-me.
O certo é que os anos passaram e a ideia que tenho – mesmo só tendo visitado o interior do festival uma vez – é que essa imagem, a da boa convivência entre as gentes de Vagos e os metaleiros, se mantém. Não conheço relatos de grandes críticas a um evento que poderia, à luz dos preconceitos, ser visto com maus olhos. Porque a música é “pesada”, as sonoridades não agradam a todos e o visual dos metaleiros pode condicionar mentes menos abertas.
No entanto, as histórias que me vão chegando, ao longo dos anos, relacionadas com o Vagos Metal Fest, têm sido sempre pautadas pelo civismo dos seus intervenientes. E convenhamos que, infelizmente, nem sempre um festival de música – seja qual for o género musical – é imune a críticas, muitas vezes fundadas, de falta de civismo e de respeito pelo outro.
A forma como Vagos tem recebido o festival e de como os festivaleiros têm respeitado a vila parece-me exemplar. E, em vésperas de uma nova edição, faço votos de que assim se mantenha.
Os vaguenses acabam por dar ao país uma lição de como pode ser belo abraçar o que, à partida, pode parecer diferente. Porque, à semelhança de todos os preconceitos, é errado julgar sem conhecer e sem dar oportunidade aos outros de mostrar quem são. E as pessoas não são a música que ouvem ou as roupas que vestem. O ser humano é muito mais do que esses pormenores. Vagos sabe disso e os metaleiros também.

Salomé Filipe
Diretora do Jornal

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