EFEMÉRIDE

Manuel Freire “desbravou” Pedra Filosofal em Vagos

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MANUEL FREIRE voltou a Vagos no dia 6 de março de 2008, para tentar ajudar a «construir sonhos». Porque, afinal, o «sonho comanda a vida», como dizia o poeta António Gedeão, que ele próprio cantou. Contudo, foi perentório quando admitiu, aos jovens, que «hoje ninguém sonha ser Ministro da Educação». Nasceu em Vagos, a meio da II Guerra Mundial, em 1942, no número 32 da Rua Vasco Rocha, onde regressou, para contar histórias aos alunos do 10º ano da Escola Secundária. Comunicador por excelência garantiu, à plateia de jovens, que o escutava, que não se considerava «importante». Porque afinal também não jogava futebol num grande clube, nem mesmo «fazia qualquer filme com Soraia Chaves» …
Passou em revista o «país cinzento, sem cor» dos anos 60, e a sua entrada para o antigo Liceu de Aveiro, onde fez o 6º e 7º anos. Recordou Zeca Afonso, morava no Largo das Cinco Bicas, e fez parte do grupo de «baladeiros», e que Manuel Freire integrou com o padre Francisco Fanhais e outros. «Serviu para acordar consciências», referiu, deixando bem vincado que musicou a «Pedra Filosofal» de Gedeão, em novembro de 1969, para o popular programa «Zip-Zip».
Confessou que agora quase não via televisão. «Cortei relações com a televisão portuguesa», revelou, apesar de almoçar semanalmente com Sérgio Godinho e o produtor Luís Filipe Costa (falecido em 20, a «voz» do 25 de Abril, que ia lendo de forma voluntária, ao microfone do RCP, os comunicados do Movimento das Forças Armadas (MFA). Hoje continua a fazer das cantigas uma atividade paralela, ainda que à revelia das editoras, cantando «onde e quando quero, com os mesmos ideais e princípios de sempre».
Entrevistei Manuel Freire, que me afiançou serem os docentes «pouco reconhecida e o trabalho pouco dignificado». Filho de professores, recordou-me o pai, o saudoso José Freire, que foi delegado escolar em Vagos, costumava levar trabalho para casa. E passava os serões «à volta dos mapas e dos problemas da escola». O que reconhecia, ser «muito mal», tal como a mãe, a professora Júlia, que também exercia. Admitindo que, mesmo assim, tinham “grande dignidade, e eram reconhecidos de outra maneira, não só pelo aparelho administrativo”. Se os pais ainda fossem vivos “estariam hoje, certamente, envolvidos na luta pela dignificação da classe”.
Acreditando nos jovens, a quem garantiu que a poesia «não é nada chata», o cantautor e músico vaguense viria a admitir que, volvidas muitas décadas sobre o 25 de Abril, continua a ver o país de «forma muito estranha». Confirmaria, de resto, que todos os dias se perdem valores e coisas importantes, nos quais fora educado. «Faz-me pena que o sentido da ética tenha desaparecido completamente», reconheceu, pesaroso, acrescentando que «o dinheiro não compra tudo».
A ação estava enquadrada na Semana da Leitura, promovida pela coordenação da Biblioteca Escolar da Secundária. E, segundo a professora Fátima Carreira, destinava-se a «estimular» a prática da leitura. Depois da escritora Margarida Fonseca Santos, o encontro com Manuel Freire «tinha valido a pena». Pela oportunidade de conhecer alguém que, sendo natural de Vagos, «marcou uma geração de baladeiros antes e depois do 25 de Abril».

Eduardo Jaques

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