Efeméride
DEZEMBRO DE 2021. O slogan “primeiro a missinha e depois o voto”, introduzido na campanha eleitoral das autárquicas pelo líder do CDS-PP, Paulo Portas, acabou por não funcionar na Gafanha da Boa Hora, onde dezenas de católicos foram impedidos de votar no final da celebração eucarística dominical. Os motivos estavam à vista: as portas que davam acesso à Escola de Ensino Básico tinham sido fechadas a cadeado por “estranhos”, pele que a assembleia de voto não pode sequer abrir.
Manhã cedo vieram as televisões, os jornais e os fotógrafos, e os “diretos” das rádios davam a conhecer ao país a situação de boicote que estava a viver-se numa das freguesias do concelho de Vagos. Concentrada na via pública, a população não arredou pé, se bem que alguns “resistentes” insistissem em exercer o seu direito de voto. A verdade é que “ninguém sabia” onde estavam as chaves do cadeado. Um dos mais persistentes, entre outros, foi Joaquim Maia, proprietário onde foi construída a avenida de acesso à ponte da Vagueira, e que mantinha um contencioso com a autarquia desde os tempos de João Rocha.
Nelson Costa, porta-voz da Comissão da Defesa dos Direitos da Gafanha da Boa Hora, viria a confirmar a normalização do processo eleitoral, para “daqui a uma semana”. E anunciava a realização de um plenário “para avaliar a situação”, decorrente do boicote. Alegando que os propósitos da Comissão se mantinham inalterados, na “defesa do interesse da população”, considerou que os problemas da estrada de Alta Tensão (construída em 1982), eram de longe os que mais afetavam toda a freguesia.
Em causa estavam problemas relacionados com a construção e legalização de habitações, já existentes na Estrada de Alta Tensão, em áreas consideradas de Reserva Ecológica e reserva Agrícola Nacional. Questões que a Comissão Técnica de Acompanhamento da revisão do Plano Diretor Municipal (PDM) de Vagos, tardavam em analisar, tal como as obras de defesa costeira e a venda das areias de S. Jacinto.
No caso da defesa da costa, uma nota da Direção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território do Centro (DRAOTC) informava, posteriormente, que as mesmas se encontravam em fase de projeto. E que existia um orçamento de 1,5 milhões de contos, que iria ser disponibilizado “para reconstituição do cordão dunar e construção de dois esporões”.
TRÂMITES NORMAIS. Pelas 10 da manhã, duas horas após o início do ato eleitoral, toda a documentação relativa ao processo, incluindo os votos, foram apreendidos pelo Comandante da GNR de Aveiro, Capitão Abreu. O boicote às autárquicas, decidido livremente pela população, dias antes, em plenário, viria a ser uma realidade. De referir que, já antes, para as presidenciais, a população da freguesia da Gafanha da Boa Hora não tinha ido a votos, como forma de protesto a um conjunto de reivindicações, que desejava ver concretizadas.
José Mário e Nelson Costa, dois dos principais dirigentes da Comissão de Defesa dos Direitos da Gafanha da Boa Hora, foram na altura identificados e viriam a ser ouvidos, mais tarde, em auto de declarações, no Posto da Guarda Nacional Republicana de Vagos. Os dois, que se apresentaram acompanhados pelos restantes membros da Comissão que também foram identificados, deram conta das “justas reivindicações” da população da Gafanha da Boa Hora. Quanto ao referido boicote, contaram o “pouco que sabiam” sobre a forma como aconteceu. O processo correu os trâmites normais, para ser presente no Tribunal da Comarca de Vagos que decidiria se haveria ou não matéria criminal.
Carlos Bento, que se apresentava a um terceiro mandato pelo CDS-PP, viria a perder a Câmara, embora tenha ganho a Assembleia Municipal e as sete juntas de freguesia. Eleito pelas listas do PSD, Rui Cruz tomou posse como presidente.
Eduardo Jaques