Desporto
Um pouco de teoria
A importância da estimulação no desenvolvimento da motricidade infantil é geralmente desvalorizada, apesar os importantes contributos de diversos psicólogos do desenvolvimento, como Wallon e Piaget, que consideram a ação e o movimento como sendo fundamentais, até para a estruturação do pensamento. No entanto, esta questão é geralmente desvalorizada, considerando-se suficientes as aquisições que as crianças fazem por si próprias, ou seja, a atividade motora espontânea é importante, mas não suficiente.
Pensamos desenvolver este tema porque os sucessos pessoais e desportivos em idades mais avançadas têm como origem naquilo que, em linguagem técnica, se designa por “alicerce motor” e que constitui a base para futuras aprendizagens motoras mais complexas.
De facto, estes escalões 3-5 anos e 6-10 anos são importantíssimos, porque é neles que tudo começa e, neste caso, iremos focar a atenção no escalão 3-5 anos e nas instituições de educação pré-escolar.
Quanto a objetivos, pretende-se o desenvolvimento psicomotor, quer ao nível da motricidade global, quer ao nível da motricidade fina. Esta última, envolve movimentos de maior precisão e controlo de movimentos muito precisos, como escrever, pintar, comer, etc, mobilizando pequenos grupos musculares. A motricidade global envolve o domínio do corpo na sua totalidade, envolvendo em simultâneo os grandes grupos musculares e capacidades qualitativas como a coordenação dinâmica geral, a coordenação óculo-segmentar, o domínio e o controlo tónico, a organização espácio-temporal, o equilíbrio e o controlo postural, a organização e orientação do esquema corporal. Todas estas capacidades são educáveis, ou seja, são treináveis e exigem uma estimulação orientada, continuada e com qualidade, realizada nestas idades.
Pode perguntar-se: e se não for feita? A resposta será: fica em falta, que se verá nas fases mais adiantadas da vida: no sedentarismo, no atraso motor, na obesidade.
A questão seguinte, será: como fazer? Que metodologias utilizar? Nestas idades deveremos promover quer a atividade espontânea (o deixar brincar livremente em espaços de qualidade, apenas com a supervisão do adulto), com a atividade motora orientada (por professor), ou seja, com aulas. Em ambos os casos, associa-se a ludicidade, ao brincar, ao explorar materiais e ao explorar o domínio do corpo em situações inabituais e à aquisição de motor paterns, ou seja, padrões motores básicos – sempre num clima de alegria, segurança, liberdade e exploração.
Como se faz em Vagos
Atualmente a grande maioria das crianças de 3 anos estão integradas em Jardins de Infância ou em pré-escolas públicas. Deveriam ser todas mas, como não estão ainda abrangidas pela escolaridade obrigatória, serão quase todas. Em 2022 estavam matriculadas 259 mil crianças destas idades em todo o país e em Vagos estão matriculadas cerca de 700, sendo 520 nas pré-escolas do Agrupamento e 180 nas IPSSs (Betel, na Misericórdia de Vagos e no CASDSC).
Em cada sala existe uma Educadora de Infância e uma Auxiliar de Educação, que asseguram a atividade pedagógica definida pelas orientações curriculares do Ministério da Educação. A Educadora assegura a lecionação da totalidade das áreas, tendo um perfil generalista de formação, ou seja, está preparada para assegurar o desenvolvimento das aulas ligadas ao desenvolvimento motor.
No entanto, a Câmara Municipal desenvolve um programa de apoio à motricidade, com 4 Técnicos Superiores Municipais, professores de Educação Física, a darem uma aula semanal a cada turma, completando a ação das Educadoras. São 23 as turmas do Agrupamento, a que acrescem 8 das instituições particulares.
Todas os Jardins de Infância têm apetrechamento em material didático e instalações minimamente adequadas (obviamente, há umas melhores do que outras). Este programa funciona há vários anos com evidente sucesso e foi altamente elogiado (assim como outros programas locais) pelo Doutor Carlos Neto, Professor Catedrático da Faculdade de Motricidade Humana e especialista em Motricidade Infantil, que em julho de 2022 realizou uma conferência em Vagos sobre este tema.
Em poucas e despretensiosas linhas pretendemos mostrar a importância do desenvolvimento motor em idades precoces e divulgar os programas locais. Fica, também, um apelo à melhoria dos espaços públicos (o parque da Quinta do Ega é um excelente exemplo) e às famílias que, cada vez mais, se vêm obrigadas a fechar os seus filhos em apartamentos.
Paulo Branco