Editorial
Muitos de nós tendemos a ser pessoas de causas. Sejam causas próprias ou não – isso já é outra questão – é rara a pessoa que eu conheço que não tenha uma causa para a qual trabalha e na qual investe tempo. Mas das coisas mais bonitas que existem, a meu ver, é quando as causas dos outros se tornam a nossa.
Chamem-lhe solidariedade, ativismo, ou o que for – as causas podem vir travestidas de muitos nomes –, pegar numa causa coletiva ao colo e dedicar-lhe o nosso tempo individual é de um valor inimaginável. Lembro-me disto a respeito da tomada de posse dos órgãos da Santa Casa da Misericórdia de Vagos. E de tantas outras Misericórdias, associações, movimentos de cidadãos, entre outros. Lembro-me disto ao passar os olhos pelas redes sociais e ao reparar na quantidade gigante de pessoas que se dedica a defender a literatura, o movimento LGBTQI+, cultura ou as minorias étnicas. Na maioria das vezes, sem receber nada em troca. Lembro-me disto sempre que vejo uma angariação de fundos para suprir uma necessidade emergente de alguém doente, que não tem acesso facilitado a um tratamento ou a um medicamento com preços indignos. Angariações essas levadas a cabo, geralmente, por pessoas externas ao problema. Lembro-me muitas vezes disto.
Se muitas das causas próprias têm valor, quando as causas de outros se tornam próprias têm ainda mais. Comove-me – comove mesmo – a dedicação.
Se concordo com todas as causas que os outros defendem? Pois está claro que não. Uma pessoa pode achar importante dedicar uma parte significativa da vida a um partido político – e quantas há que o fazem e que, acredite-se, não têm em vista alcançar nenhum cargo importante, mas sim bater-se por determinado ideal. E eu posso achar que isso é uma perda de tempo e que aquela pessoa estava bem melhor, e a ser mais útil, a trabalhar no Banco Alimentar Contra a Fome. Mas o que é importante para uma pessoa não é, necessariamente, importante para outra. E isso não torna nada menos meritório. É o poder da liberdade e é o que nos torna, acredito eu, seres únicos.
Agora, uma coisa é certa: as causas são importantes. Movem e fazem mover. E permitam-me que volte à tomada de posse os órgãos da Santa Casa. Parabéns, a quem aceitou o desafio de abraçar a causa (mais uma vez). Parabéns.
Salomé Filipe
Diretora do Jornal