O bacalhau está escolhido e prepara-se para ir para a panela, com os grelos e com as batatas. Há poucas coisas tão portuguesas quanto comer bacalhau cozido com batatas e verduras na ceia de Natal. Repito várias vezes, ao longo do ano, que aquela iguaria me sabe melhor na noite de 24 de Dezembro. Só que me esqueço, outras tantas, que se calhar nem toda a gente a come.
Ter bacalhau na mesa para a noite de Consoada é, por estes dias, um luxo a que não sei se uma grande parte dos portugueses terá acesso. É que terminamos 2022 com um sentimento agridoce: por um lado, parece que estamos cada vez mais longe da pandemia que nos roubou dois anos de vida plena e que ainda assombra. E deixamos para trás 365 dias em que vimos a inflação arrancar-nos a tranquilidade que vínhamos a tentar recuperar. Por outro, entramos num ano que se prevê que continue a ser duro. Ou que seja mais duro, até.
Não há previsão de quando é que a estabilidade regressa às vidas dos portugueses. Não se sabe se um dia os combustíveis regressam aos valores de outrora, se a fatura da energia vai voltar a ser passível de ser suportada pelas famílias e se o poder de compra retorna a níveis de outrora. São demasiados “ses” para se entrar tranquilo num novo ano.
Avizinha-se 2023 e os decisores políticos já o pressagiam um ano difícil. Veja-se o exemplo do edil de Vagos, Silvério Regalado, que optou por apertar o cinto na programação de Natal – e bem, arrisco-me a dizer –, com vista a ter capacidade de manobra para os desafios expectáveis para os próximos 365 dias. Mas, no final de tudo, resta a esperança.
O começo de um novo ano chega sempre revestido de esperança. Que este ano, pelo menos, isso não seja diferente. E o que eu desejo a todos os leitores do Eco de Vagos é que sonhem na mesma, apesar das condições atuais serem adversas. Sonhar e ter esperança não paga imposto. Ainda.
Num ano marcado pela guerra e pela inflação desmedida, que a 24 de Dezembro, à noite, façamos esquecer a atualidade quando nos sentarmos à mesa com a família. Seja a comer bacalhau ou qualquer outro alimento. Que tenhamos todos, sem exceção, uma noite feliz. O resto virá.
Salomé Filipe
Diretora do Jornal